quarta-feira, 20 de abril de 2016

Especialistas chamam a atenção para compras na Administração Pública com Dispensa de Licitação


Segundo o Doutor em Direito penal pela Universidade Complutense de Madri, Mestre em Direito Penal pela USP, Diretor-Presidente da Rede de Ensino LFG e Co-coordenador dos cursos de pós-graduação transmitidos por ela. Foi Promotor de Justiça (1980 a 1983), Juiz de Direito (1983 a 1998) e Advogado (1999 a 2001), Luiz Flávio Gomes, "a regra constitucional é a de que as obras, serviços, compras e alienações da Administração Pública serão contratados mediante processo de licitação pública (art. 37, inciso XXI, da CF/88). Excepcionalmente, no entanto, a Lei 8.666/93, que regulamentou o mencionado dispositivo constitucional no que tange às licitações e contratos da Administração Pública, traz hipóteses nas quais a licitação pode não ser realizada. A licitação é um procedimento administrativo de observância obrigatória (em tese) pelas entidades governamentais, pautado na igualdade entre os participantes e com o intuito de obter a melhor proposta dentre as apresentadas pelos interessados.
Como dissemos, é possível que a licitação não ocorra e estas hipóteses estão insertas em dois grupos; o primeiro é o das inexigibilidades e o segundo das situações de dispensa da licitação. É inexigível a licitação quando ela é juridicamente impossível. Há dispensa de licitação quando, embora possível sua realização, a lei dispensa o procedimento.
Veja-se assim que ou a lei permite a não realização da licitação, ou ela é impossível de ser feita (pela inviabilidade de competição) ou ela há de ser feita, sob pena de se configurar o crime previsto no artigo 89, da mencionada Lei 8.666/93, in verbis :
Art. 89. Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade:
Pena - detenção, de 3 (três) a 5 (cinco) anos, e multa.
Parágrafo único. Na mesma pena incorre aquele que, tendo comprovadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, beneficiou-se da dispensa ou inexigibilidade ilegal, para celebrar contrato com o Poder Público.
Recentemente o STJ entendeu (HC 171.152) que o crime em tela é de mera conduta. Para a Sexta Turma do Tribunal da Cidadania, o crime de dispensa ou inexigibilidade ilegal de licitação não depende de prejuízo ou fraude efetiva ao erário, bastando a mera conduta irregular para sua configuração.
O julgamento se deu nos autos do HC 171.152 , cuja defesa pedia absolvição do acusado (ex-vice-prefeito de Mogi Mirim) por faltar justa causa à ação penal, já que não houve por parte do impetrante a intenção de prejudicar a Administração ao deixar de proceder à licitação prévia de um contrato com uma empresa de terraplanagem. Para o relator, Ministro Og Fernandes, no entanto, a caracterização do crime ocorre com a presença do dolo genérico", afirma Luiz Flávio.

O que diz a jurisprudência: 

HABEAS CORPUS Nº 171.152 - SP (2010/0079761-0)
RELATOR : MINISTRO OG FERNANDES
EMENTA
HABEAS CORPUS . DISPENSA DE LICITAÇAO FORA DAS HIPÓTESES LEGAIS. ART. 89, DA LEI Nº 8.666/93. COMPROVAÇAO DE DOLO ESPECÍFICO OU PREJUÍZO À ADMINISTRAÇAO. DESNECESSIDADE.
1. Segundo a iterativa jurisprudência desta Casa de Justiça, o crime previsto no art. 89, da Lei nº 8.666/93 é de mera conduta, não havendo a exigência, para sua caracterização, da comprovação do dolo específico de fraudar o erário ou de causar prejuízo à Administração. Precedentes.
2. Na hipótese, o paciente, no exercício do cargo de Vice-Prefeito, teria firmado, verbalmente, contrato com empresa de terraplanagem, sem a prévia realização de licitação.
3. De se acrescentar que as instâncias ordinárias aludiram ao fato de que a contratação ocorreu sem que existisse previsão legal nem situação emergencial.
4. Além disso, a condenação do paciente foi confirmada em sede de apelação e também através de revisão criminal. Chegar-se a conclusão diversa demandaria a incursão no conjunto fático-probatório, providência vedada na via eleita.
5. Ordem denegada.
O cuidado que temos que ter, no delito ora enfocado, é o de não admitir referido delito por razões meramente burocráticas (administrativas). Não temos dados concretos para dizer se, no caso concreto, teria havido puramente um erro formal ou se a inexigibilidade da licitação podia claramente ser evitada. Tudo isso depende da análise do caso concreto. De qualquer modo, queremos só registrar nossa preocupação: nenhum crime pode ser admitido sem ofensa ao bem jurídico. A inobservância de procedimentos formais podem dar ensejo a outro tipo de sanção. Para o Direito penal o fundamental é a ofensa ao bem jurídico.